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15/01/2015 20:11

A súmula n.º 35 do STF e o novo código civil

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_88/Artigos/PDF/JadisonDias_Rev88.pdf

Resumo: As principais fontes jurídicas devem estar alinhadas ao mundo contemporâneo, coadunando-se, igualmente, com a evolução do Direito e da sociedade. Através desse prisma, as súmulas, sinonímias de jurisprudência condensada e, por conseqüência, reflexo de relevante embasamento de consulta e pesquisa, carecem corresponder ao progresso normativo e aos anseios reais da moderna estrutura da Ciência Jurídica Brasileira. Nesse sentido, é de se considerar que os Entendimentos Sumulares derivados do Pretório Excelso – por se encontrarem entre as maiores fontes do Direito Pátrio - precisam expressar a atualização do Tribunal com os tempos hodiernos. Entrementes, demonstra-se com clareza que notadamente a Súmula n.º 35 do Colendo Supremo Tribunal Federal (não cancelada) destoa do novo regramento civil, deixando de evidenciar o respaldo que lhe haveria de ser peculiar, o que motiva a entender pelo desuso e necessária re-avaliação daquela, com vistas a facilitar o trabalho do jurista e clarificar certos institutos. 

Abstract: The main juridical sources should be aligned to the contemporary world, being combined, equally with the evolution of the Right and of the society. Through that prism, the synonymies of condensed jurisprudence and, by consequence, reflex of relevant consultation and research, needs to correspond to the normative progress and the real longings of the modern structure of the Brazilian Juridical Science. In that sense, it’s being considered that the Understandings derived of High Court - goes being found among the Patrio’s Rights largest sources-it was needed to Express the updating of the Tribunal with the nowadays teams. However, it demonstrates with clarity that especially Colendo Federal Supreme Court’s Abstratct nº 35 (no canceled) sounds out of tune of the new civil rules, stopping evidencing the backrest that should be peculiar, what motivates to understand for the disuse and necessary reverse-evaluation of that, with views to facilitate the jurist’s work and to clarify certain institutes. 

Keywords: abstratct; STF; union; stable; contemporary

Palavras-chave: súmula; STF; união; estável; contemporaneidade

 

Sabidamente, as súmulas - caracterizadas em seus teores principais como sendo o entendimento jurisprudencial condensado e majoritário - merecem a observância e notoriedade no mundo jurídico. Não menos certo seria afirmar que tais elementos de auxílio e direcionamento do jurista devem estar em consonância com a evolução, sobretudo, da sociedade e das normas.

Isso porque, mencionado instrumento de base (representado pela suma dos acórdãos já remansosos) possui o caráter de demonstrar a concepção assentada dos Tribunais deste País.

Através do prisma dessas linhas iniciais, impende ressaltar que a mais alta Corte Judiciária Brasileira, o Supremo Tribunal Federal - STF -, expressa o seu entendimento, resumido, atualmente em mais de 700 (setecentas) súmulas. Também é cristalino que essas súmulas, no mais das vezes, reúnem decisões bem formuladas e auxiliares do crescimento social.

Entrementes, basta uma análise perfunctória do Entendimento Sumular n.º 35 para se constatar a distância sobeja deste quanto à realidade hodierna do Direito Brasileiro.

Confirmando isso, colaciona-se dita Súmula, in verbis:

“Em caso de acidente de trabalho ou de transporte, a concubina tem direito de ser indenizada pela morte do amásio, se entre eles não havia impedimento para o matrimônio”. Sublinha-se.

Pois bem, a primeira parte desse dispositivo não enseja maiores dissensos, tão-somente refere que “em caso de acidente de trabalho ou de transporte, a concubina tem direito de ser indenizada pela morte do amásio”. Logo, de pronto pressupõe-se que a concubina (termo literal atual: amante), em momento contínuo ao falecimento do parceiro pode postular a respectiva verba indenizatória, em sendo a “causa mortis” as elencadas acima (acidente de trabalho/transporte).

Como se disse alhures, até aí não perduram divergências.

De outro turno, em análise mais amiúde da segunda parte da Súmula, já à luz do novel Diploma Civilista, encontraremos óbices à efetiva aplicação daquela, porquanto diametralmente oposta à atual regra substancial.

Com escusas pela fastidiosa tautologia, repisamos o segundo trecho, Ipsis litteris: “Se entre eles não havia impedimento para o matrimônio”  Grifo nosso.  

Aqui reside o ponto veementemente esgrimado neste singelo estudo.

O motivo é simples, uma vez que, por coincidência ou não, verifica-se que tal parte confronta-se com a norma civilista (em vigor desde 2003) de forma mais que evidente, porque ex vi do artigo 1.727 do Código Civil (CC) objetivamente demonstra-se que “as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato”, sublinhei. Ou seja, resta extremamente remansoso que o concubinato pressupõe impedimento para casar.

Assim, em sendo o concubinato um instituto que, per se, denota o impedir de casar, obviamente a Súmula n.º 35 do STF está em total confronto com o Código Civil, ao fazer constar “se entre eles não havia impedimento para o casamento.” Sublinhado.

Ora, evidencia-se que, em se tratando de concubinos, será um consectário lógico esse impedimento. Desse modo, a interpretação literal daquela Súmula merece ressalvas, pois redigida à época da vigência do Código Civil de 1916.

Talvez poder-se-ia adequá-la, em julgados posteriores, à União Estável (artigo 1.723 do CC), a qual pelo menos nos dias atuais demonstra falta de impedimento para casar. 

Ademais, gize-se que a referência dada no período da condensação sumular é perfeitamente compreensível, uma vez que união estável e concubinato eram institutos não bem distinguidos.

Como reflexo disso, aliado a antigo conceito, concluiu EDGAR DE MOURA BITTENCOURT (1985:17) que “companheira é a designação elevada que se dá à mulher unida por longo tempo a um homem, como se fosse sua esposa; mas, como não existem os laços do casamento civil, é concubina” (Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil – Direito de Família, São Paulo, Atlas, 2004, p. 51).

 

Não havendo impedimento de casar, esse conceito se enquadraria, hoje, no que diz com a União Estável.

Nessa senda, julgados antigos utilizaram-se da Súmula n.º 35 do Pretório Excelso para o primordial embasamento, na forma reunida a seguir:

[1]“Ementa: ACIDENTE DO TRABALHO. DIREITO À INDENIZAÇÃO EXERCIDO PELA CONCUBINA. INTERRUPÇÃO DE PRESCRIÇÃO.DIREITO A INDENIZAÇÃO, EXERCIDO PELA CONCUBINA, NA LEGISLAÇÃO DE CIDENTES NO TRABALHO. INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO”.

[2]“Ementa: NÃO HAVENDO IMPEDIMENTO LEGAL PARA O MATRIMONIO, A CONCUBINA, CASADA ECLESIASTICAMENTE, TEM DIREITO A REPARAÇÃO PELA MORTE DO COMPANHEIRO, EM CONSEQUENCIA DE ACIDENTE FERROVIARIO (ART. 22 DO D.26818 DE 1912)”.

Mais recentemente, localizam-se arestos do Superior Tribunal de Justiça, ora colacionados:

[3]“Decisão: Sustenta-se, no especial, que violado o disposto no artigo 1º da Lei 8.971/94 que cuida de direito da concubina a alimentos, dispositivo que, aliás, se encontra superado pela legislação posterior, relativa à união estável. Parece-me claro que aquela norma não há de ser entendida como restringindo direitos que anteriormente já se considerava tivesse a concubina. E esses lhe eram reconhecidos com base na Lei de Acidentes do Trabalho. Nesse sentido a Súmula 35 do Supremo Tribunal Federal. Impugna-se, ainda, a parte do julgado que reconheceu o direito de acrescer, ou seja, que deixando de ser devida a pensão a um dos beneficiários, a parcela correspondente seja acrescentada à do outro. O recurso veio apenas pelo dissídio e não se cuidou de demonstrar a similitude fática entre as hipóteses. E cumpre reconhecer que, para decisão a respeito da matéria, relevam aspectos dizendo com os fatos. Com efeito, em certas circunstâncias, a diminuição de encargos, por diminuírem os beneficiários, levará a que sejam melhor atendidos os demais. Em outras, isso poderá deixar de ocorrer, em virtude de diversos fatores. Assim, por exemplo, se alguém tem comprometida a maior parte de sua renda, em razão de ter muitos dependentes, razoável supor que, tornando-se esses menos numerosos, o comprometimento será menor. Considero, pois, não demonstrada a divergência. Nego provimento ao agravo. Brasília, 18 de maio de 1999. MINISTRO Eduardo Ribeiro, Relator”.

[4]“Ementa: ACIDENTE DO TRABALHO. CONCUBINA DO ACIDENTADO. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO PELO DIREITO COMUM, SOB ALEGAÇÃO DE CULPA GRAVE DO EMPREGADOR. A CONCUBINA DA VITIMA, FALECIDA EM ACIDENTE DE TRABALHO E BENEFICIARIA DA PENSÃO PREVIDENCIARIA, E PARTE LEGITIMA AD CAUSAM PARA POSTULAR A INDENIZAÇÃO DE DIREITO COMUM. A REFERENCIA A ''ALIMENTOS''7, CONSTANTE DO ARTIGO 1537, II, DO CODIGO CIVIL, VALE COMO MERO INDICE PARA O CALCULO DO RESSARCIMENTO, OUTORGADO JURE PROPRIO  AO LESADO. LIÇÕES DA DOUTRINA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ARTIGOS 7., XXVIII E 226, PARAG. 3. CONTRARIEDADE AO ARTIGO 159 DO CODIGO CIVIL E DISSIDIO JURISPRUDENCIAL”.

Considerados os aspectos jurisprudenciais e doutrinários, registra-se que atualmente concubinato e união estável não merecem equiparação. É impossível tratar ambos os institutos como se sinônimos fossem, porquanto, como visto, o Direito moderno, a teor do Novo Código Civil, delimita bem a diferença entre aqueles, salientando-se sempre que a relação de concubinato pressupõe impedimento para casar.

Deixe-se claro, ainda, que não se pretende excluir eventuais direitos da concubina. No entanto, a clareza das súmulas, ainda mais quando inadequadas ao Direito vigente, demonstra-se de fundamental relevância para os meios jurídico e social.

Nesse passo, o cancelamento, revogação ou substituição da Súmula n.º 35 do Supremo Tribunal Federal, em vista do que anteriormente se referiu, demonstra-se a medida mais adequada ao atual estágio de evolução do Direito Pátrio.

Pelo fio do exposto, tendo em mira que “a súmula de jurisprudência é o resumo ou a condensação de vários acórdãos, do mesmo tribunal, que adotem idêntica interpretação de matéria jurídica, com caráter persuasivo”[5], não se pode olvidar que os verbetes emanados, mormente dos Tribunais Superiores e do Supremo Tribunal Federal, merecem especial respaldo, cabendo por isso as alterações pertinentes quando se fizer necessário, notadamente em acompanhamento da evolução jurídica - exatamente como carece o caso em tela.

[1]             RE 15839; Relator Min. Mario Guimarães, Julgamento 08/11/1951 01 - Primeira Turma. Publicação DJ DATA-07-05-52.

[2]             RE 47724; Relator Min. Victor Nunes, Julgamento 26/03/1963 02 - Segunda Turma. Publicação ADJ DATA-06-06-63.

[3]             AI Nº 160.676 - Rio de Janeiro (97/0068126-2). Data de Publicação: 25/05/1999.

[4]               RESP-589/SP; 1989/0009804-7; Relator Min. Athos Carneiro. Quarta Turma. Data da Decisão: 14/08/1990. DJ DATA:10/09/1990.

[5]               Notícias do Supremo Tribunal Federal. Publicada em 06.11.2003, às 17h30min.
 

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